Os lançamentos adiados da Artemis I

À quarta tentativa foi de vez

 

29 de agosto, 3 de setembro e 27 de setembro. A partida da nave Orion foi adiada por 3 vezes ao longo dos últimos 3 meses. Mas estes adiamentos são bastante comuns nas missões espaciais.

Nas primeiras tentativas detetaram-se fugas de hidrogénio líquido no motor e na alimentação de combustível que não foram solucionadas a tempo. No final de setembro, o diretor de operações da missão Artemis I suspendeu o lançamento devido à passagem devastadora do furacão Ian na Florida. O foguetão e a nave não sofreram quaisquer danos e permaneceram abrigados no seu edifício de montagem.

Conheça aqui em detalhe os motivos técnicos e meteorológicos que forçaram os peritos a tomar estas decisões bem como as medidas que foram tomadas para evitar novos adiamentos. Perceba também a importância de prever várias janelas de oportunidade para o arranque de uma missão deste género.

Todas as tentativas de lançamento foram acompanhadas em direto na ESA Web TV

Figura 1 . O foguetão SLS foi colocado a 18 de março de 2022 na plataforma 39B do Centro Espacial Kennedy da NASA, na Florida (Créditos: NASA).

27 de setembro: e tudo o Ian levou

No passado dia 27 de setembro, o furacão Ian forçou o megarocket do Sistema de Lançamento Espacial (SLS) a voltar ao seu abrigo no Edifício de Montagem de Veículos ou VAB (1) . O foguetão SLS foi o escolhido para transportar a nave Orion para fora da órbita terrestre.

O furacão Ian foi descrito por oficiais como potencialmente "catastrófico" para a Florida (Figura 2), o que naturalmente inclui a plataforma de lançamento do SLS no Centro Espacial Kennedy. No dia 28 de setembro, o administrador da NASA Bill Nelson dirigiu as seguintes palavras à população local: "À medida que o furacão Ian se intensifica e nos preparamos para o seu impacto, temos o dever de pensar na segurança de todas as famílias da Flórida, especialmente nas da nossa equipa de resgate. Obrigado a todos pela vossa dedicação. Saibam que a NASA tudo fará para garantir a vossa segurança e bem-estar".

Na altura já se previa que a próxima janela de oportunidade só iria abrir em novembro, embora a NASA tenha dito numa conferência de imprensa que havia numerosas opções em cima da mesa dependendo do tempo, da segurança das equipas e da prontidão do foguetão em partir.

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(1) O Edifício de Montagem de Veículos, ou VAB (traduzido do Inglês Vehicle Assembly Building ) localiza-se também no Kennedy Space Center da NASA na Florida. Todos os foguetões que transportaram seres humanos para além da órbita terrestre baixa foram montados nas suas instalações. Para mais informações sobre o VAB veja esta página da NASA .

Figura 2 . Imagens de satélite com cores reais do furacão Ian por volta das 16:00 GMT no dia 27 de setembro de 2022 (Crédito da imagem: NASA).

Depois de mais um adiamento, os gestores da missão reuniram-se e decidiram que seria mais prudente renunciar a tentativas de lançamento adicionais nas semanas seguintes. Era a terceira tentativa falhada num curto intervalo de tempo. Segue-se uma breve cronologia dos adiamentos anteriores:

29 de agosto: imprevistos resolvidos fora de tempo

No início da manhã deste dia em Portugal, o carregamento do propulsor do foguetão atrasava-se em cerca de uma hora devido às tempestades que ocorreram na Florida, perto da zona de lançamentos.

Pouco depois, as verificações de segurança que são habitualmente efetuadas antes deste tipo de lançamentos obrigaram a equipa técnica a interromper a contagem decrescente. "O diretor de lançamento cancelou a operação devido a uma fuga no motor que não podia ser parada", explicaram os responsáveis da missão Artemis. "Os engenheiros estão neste momento a recolher dados sobre este motor e o teste de verificação de fuga de hidrogénio que não funcionou".

De acordo com a informação oficial da NASA, os controladores de lançamento tiveram de avaliar a razão pela qual os motores RS-25 da parte inferior do veículo não se encontravam à temperatura adequada para a descolagem. O problema ainda foi resolvido, mas fora do tempo previsto para o lançamento, cuja janela de oportunidade tinha a duração de 2 horas.

Medidas tomadas 

Logo após a suspensão da primeira tentativa de lançamento, os técnicos da NASA examinaram o funcionamento do impulsionador do núcleo do foguetão SLS para perceber como poderiam fazer face à fuga de hidrogénio detetada durante a contagem decrescente do lançamento.

No dia 3 de setembro, os controladores iniciaram mais cedo o arrefecimento dos quatro motores principais do foguetão para tentarem atingir a temperatura correta para o lançamento. Esta abordagem tinha sido testada com sucesso durante os testes no Centro Espacial Stennis no Mississippi, também nos EUA. No entanto, esta medida não chegou para resolver o problema...

3 de setembro: nova fuga de hidrogénio líquido

Durante esta segunda tentativa, os engenheiros detetaram uma fuga numa cavidade localizada numa interface entre a linha de alimentação de combustível e o foguetão, usada para encher e drenar o hidrogénio líquido do veículos. Os técnicos realizaram três tentativas para selar a fuga, todas elas sem sucesso. 

O problema foi detetado numa fase inicial das operações de carregamento de hidrogénio chamada "chilldown", durante a qual os controladores de lançamento arrefecem as linhas e o sistema de propulsão antes do transporte de hidrogénio líquido para o tanque do foguetão à temperatura de -253º C. Nesta fase foi dado um comando inadvertido que resultou no aumento temporário da pressão no sistema. Ainda não se sabe se o choque na pressurização contribuiu para a fuga de combustível. Os engenheiros precisaram de alguns dias para examinar esta situação e preparar soluções.

Figura 3 . Fotografia tirada no infravermelho em tons de preto e branco do foguetão SLS com a nave espacial Órion a bordo, visto na plataforma móvel de lançamento 39B no Centro Espacial Kennedy da NASA, na Florida, a 30 de agosto de 2022.

Adiamentos são bastante comuns

Este tipo de problemas é, no entanto, muito frequente no lançamento de foguetões. "Não avançamos enquanto não estiver tudo a 100%.", disse Bill Nelson, administrador da NASA, num briefing após a suspensão do lançamento. "O foguetão SLS ainda não pode descolar. Há certas diretrizes que têm de ser cumpridas. E penso que esta situação serve para comprovar que esta é uma máquina muito complicada, um sistema muito complicado, e tudo tem de funcionar".

Rock(et) and Roll

A NASA teve de pôr em prática as medidas obrigatórias de segurança pública previstas para o cancelamento ou adiamento prolongado de um voo espacial. Para cumprir com essas normas, enquanto as baterias do sistema não foram reiniciadas, o foguetão e a nave espacial foram transportados de volta para o Edifício de Montagem de Veículos. Estas instalações localizam-se a quase 7 km de distância da plataforma de lançamento, pelo que a equipa técnica local teve de optar por deslocar os dois veículos fazendo-os ‘rebolar’ de uma forma controlada. Trata-se da forma segura mais rápida de os transportar até ao seu destino.

A importância das janelas de oportunidade

Já se sabia que assim que a missão Artemis I estivesse pronta para ser retomada, todas as equipas responsáveis da NASA, ESA, indústria e parceiros internacionais teriam de estar prontas para lhe dar o devido apoio. No entanto, o momento da descolagem do foguetão não dependia apenas delas. O alinhamento da Terra e da Lua determinam a data e a hora do lançamento do foguetão SLS com a nave espacial Órion - juntamente com vários critérios de desempenho dos dois veículos.

Por outras palavras, para atingir todos os objetivos da missão, a equipa de controlo precisou de considerar a complexa mecânica orbital envolvida no lançamento numa trajetória precisa em direção à Lua, tendo em conta a rotação da Terra em torno do seu eixo e a órbita da Lua em torno da Terra.

Geralmente há duas semanas com oportunidades de lançamento, seguidas de outras duas sem qualquer oportunidade. Neste caso, as janelas que se seguiram eram de 17 a 31 de outubro e de 12 a 27 de novembro, com um total de 23 possibilidades de lançamento. A NASA considerou desde logo que haveria maiores probabilidades de sucesso em novembro.

Pode ver uma lista das restantes janelas de oportunidade nesta página da ESA , bem como um vídeo explicativo sobre este assunto. Compreensivelmente, todo este processo é bastante complexo. Afinal de contas... é MESMO rocket science.